Cada dia uma linha que fosse, uma frase, uma voz , um fonema apenas. Simplesmente ouvir algo de dentro e transferir para o papel o que quer que fosse. Disciplina , empenho, comoção, conexão.
Como dá para ser escritor assim, sem dilemas existenciais, sem questões para resolver, sem teorias para defender, sem dor por mim, sem necessidade de alguém. A análise corrói, tira a potência, ela é a culpada por eu não conseguir mais expressão. Tudo que expresso é em vão, é simples, farei da existência a simplicidade da gota caindo do céu e batendo na planta. Tudo é banal frente aos olhos da pessoa analisada.
O mundo perdeu a complexidade. Os analistas acabaram com o mundo, acabaram com os problemas que geravam boa literatura.Eles acabaram com os personagens redondos ou quadrados, com os pronomes indefinidos, com os sujeitos indeterminados. Nietzsche culpou Deus, Freud culpou os pais, mas hoje, a quem vamos culpar??? Falta um culpado para a nossa pós-modernidade, é a hora de nos convencermos de que somos nós mesmos os culpados. Mas quem quer ser culpado de alguma coisa. Isso implica em pena, punição e não queremos ter trabalho, ter ansiedade, ter tensão. Vivemos a busca do mundo sem tensão, sem intenção, sem querer criar expectativas, em qualquer lugar. Tudo claro, simples, resolvido, higienizado, limpo, tão limpo, que parece que passou uma borracha voadora cortando as letras e os pensamentos que flutuavam. Drogas inúmeras: chinesas, bolivianas, americanas, paraguaias, qualquer uma, para acordar, para dormir, para trabalhar, para trepar, para tudo tem droga. Doenças para todos os tipos de diagnósticos, não temos mais médicos, temos analistas de imagens e de sentimentos e de sensações. E o saco cada vez mais vazio.
Um comentário:
Elis, Elis, Elis!! Que texto bacana! Que percurso sobre a escrita! Vc sempre com o alto teor de reflexões, lugar para se pensar as coisas, "a coisa"...
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